sábado, 16 de agosto de 2025

 

O fotógrafo oficial e o protocolo

Na vida pública, nada é por acaso. Uma cadeira deslocada, um gesto fora de hora ou uma fotografia mal enquadrada podem pôr em causa a imagem de uma instituição. É por isso que o fotógrafo oficial não pode limitar-se a dominar a técnica: tem a obrigação de conhecer as normas de protocolo.

O protocolo, lembra António de Araújo, é o conjunto de regras que asseguram ordem e respeito nas cerimónias. Quando o fotógrafo ignora esse código, corre o risco de se tornar protagonista indesejado: invade espaços restritos, interrompe discursos com cliques ou regista imagens que desrespeitam a hierarquia. O erro não é apenas fotográfico, é institucional.

Respeitar a ordem e a precedência é fundamental. Um chefe de Estado não pode aparecer deslocado numa foto de grupo. A discrição também conta: não há espaço para correrias atrás de ângulos ou para o barulho da câmara durante um hino nacional. O respeito ao espaço cerimonial é outra regra de ouro: atravessar zonas reservadas é mais do que falta de educação, é quebra de protocolo. Até a indumentária do fotógrafo comunica: o profissional também é parte da cena e deve estar à altura dela.

Juan Carlos Gafo insiste que “o protocolo não é rigidez, é harmonia”. E essa harmonia depende de cada detalhe. Uma fotografia pode valorizar um acto diplomático ou, pelo contrário, transformá-lo numa confusão de imagens mal posicionadas. Como bem lembra Sílvia Helena Zanirato, a comunicação institucional também se faz através das imagens. Muitas vezes, é a fotografia e não o discurso que fica para a história.

Em Moçambique, onde as instituições ainda consolidam a sua imagem perante os cidadãos e o mundo, o papel do fotógrafo oficial ganha peso extra. Ele não apenas regista: legitima. A sua lente testemunha momentos de Estado que se tornam memória colectiva.

Ser fotógrafo oficial, portanto, não é apenas carregar uma câmara. É carregar uma responsabilidade histórica. Conhecer o protocolo não é um detalhe: é parte essencial do ofício. A fotografia pode imortalizar a ordem e a dignidade de uma cerimónia. Ou pode eternizar o descuido. A escolha está, quase sempre, no olhar de quem está atrás da lente.

 Umbeluzi: Quando o sustento vira armadilha!

Texto e fotos de Carlos Uqueio, publicado no dia 16/08/2025-Jornal Noticias

Nas margens do rio Umbeluzi, em Boane, um retrato discreto e duro revela-se todos os dias. Ali, jovens e adultos mergulham tanto de dia assim como de noite, no leito do rio para extrair areia, que depois segue para obras e construções. O que para muitos é apenas matéria-prima, para eles é a única forma de garantir o sustento da casa.

Mas o preço é alto. O Umbeluzi é um rio que carrega crocodilos nas suas águas silenciosas, esperando por quem se distrai ou não tem escolha. Sem equipamentos de proteção, sem licença ou acompanhamento técnico, esses exploradores avançam com baldes e sacos, confiando apenas na própria força e na esperança de sair dali vivos.

A prática, além de ilegal, corrói o meio ambiente. As margens cedem, o leito do rio vai ficando mais fundo e o seu equilíbrio natural se perde. A extração descontrolada favorece inundações e destrói habitats, deixando o futuro do ecossistema tão vulnerável quanto quem arrisca o corpo dentro d’água.

Enquanto alguns se dedicam a explorar inertes, há mulheres que lavam roupa e carregam-na para o consumo, como ilustram as imagens. Não é só nas margens do rio que essa exploração acontece. Nas proximidades, formam-se pequenos grupos que também praticam essa actividade, evidenciando como a dependência da areia vai para além do leito do Umbeluzi e infiltra-se no quotidiano de quem vive ali.

“É daqui que tiramos o pão. Sabemos do perigo, mas não temos outro caminho”, confessa um jovem, sem largar o balde. O olhar dele, captado pelas lentes desta reportagem, diz o que as palavras não alcançam: a necessidade empurra para o risco, mesmo que seja contra a natureza  e contra a própria vida.

Esta reportagem fotográfica de Carlos Uqueio mostra  mais do que homens no trabalho. Ela expõe o contraste doloroso entre a luta pela sobrevivência e a destruição silenciosa do ambiente. Um ciclo que ameaça o rio, as suas margens e todos os que dependem dele.

No fim, fica a pergunta estampada nas imagens: até onde vale a pena cavar o presente, se isso significa afundar o futuro?










terça-feira, 5 de agosto de 2025

 

                               São Tomé e Príncipe:

              Um país pequeno, mas com histórias imensas

Localizado no Golfo da Guiné, a cerca de 300 quilómetros da costa de África Central, São Tomé e Príncipe é o segundo menor país do continente. Com pouco mais de 230 mil habitantes, o arquipélago é formado por duas ilhas principais e várias ilhotas, onde a natureza exuberante e o ritmo tranquilo do dia a dia se encontram. A língua oficial é o português, mas também se ouvem crioulos locais, reflexo da diversidade cultural do país.

As praias de São Tomé e Príncipe são parte essencial da vida dos seus habitantes. Em quase todas elas, é comum ver barcos de pesca alinhados na beira-mar. Essas embarcações, muitas vezes construídas de forma artesanal, são o sustento de centenas de famílias. Ao amanhecer, pescadores partem para o mar e regressam algumas horas depois com peixes frescos, que são vendidos directamente nos mercados ou nas próprias praias, onde o comércio informal dá vida ao cenário.

O comércio informal é, aliás, uma das marcas do arquipélago. Ruas e praças ganham cor com barracas de frutas tropicais, legumes, peixe seco, roupas e pequenos utensílios. Cada banca é uma história: mulheres que sustentam famílias, jovens empreendedores e idosos que mantêm vivas tradições antigas de troca e venda directa.

Para circular entre bairros, vilas e mercados, os mototáxis chamados localmente de “ya motó” , são indispensáveis. Rápidos e acessíveis, eles funcionam como o principal meio de transporte para quem vive ou visita o país. Não é raro ver passageiros equilibrando sacolas de compras ou mesmo produtos para revenda nas feiras locais, numa prova de como a economia formal e informal se entrelaçam no dia a dia.

Mais do que paisagens deslumbrantes, São Tomé e Príncipe é um mosaico de trabalho, tradição e proximidade entre as pessoas. Entre barcos à beira-mar, mercados improvisados e a agilidade dos mototáxis, cada detalhe revela a essência de um arquipélago que, apesar de pequeno, tem uma identidade rica e profundamente ligada ao seu povo.