terça-feira, 8 de abril de 2025

 Quando o medo da estrada ofusca a beleza do destino

Artigo escrito por Carlos Uqueio, publicado no jornal domingo, 06/04/2025

Viajar deveria ser um sinónimo de descoberta e alegria. Mas, ao seguir para Guinjata, uma praia localizada em Inhambane , lugar que sempre me fez pensar na baía dos cocos e de pessoas acolhedoras , fui surpreendido por um sentimento inesperado: o medo.

Escolhi o transporte interprovincial para enfrentar as estradas até Inhambane, mas assim que a viagem começou, algo mudou dentro de mim. O motorista, apressado, acelerava sem cuidado, fazendo ultrapassagens arriscadas que me deixavam inquieto. Meu coração disparava, como se quisesse me alertar sobre um perigo iminente.

A verdade é que a forma como alguns motoristas de transporte interprovincial conduzem é arrepiante e assustadora, razão pela qual continuamos a assistir a vários acidentes causados pela indisciplina desses condutores. Durante o trajecto, alguns passageiros pediram para descer, alegando medo e insegurança. Aquela cena só reforçava a sensação de vulnerabilidade que já havia se instalado.

Cada curva parecia um teste de sorte. Em uma ultrapassagem, concretamente em Chissibuca, quase colidimos com um carro vindo na direcção contrária. O grito abafado dos passageiros fez o tempo parar por um instante. O motorista desviou bruscamente, e o carro pareceu flutuar por alguns segundos. Por sorte, escapamos ilesos, mas o medo já havia se enraizado profundamente.

Não era só uma viagem; era um confronto com a irresponsabilidade e a incerteza. Pelo caminho, vi “cruzes e flores murchas”, lembranças de vidas interrompidas por imprudência. Será que algumas dessas pessoas também sonhavam em chegar às praias de Inhambane?

Quando finalmente avistei o mar, concretamente em Guinjata, senti um alívio enorme. Aquele azul vibrante parecia me acalmar. As pessoas, sempre simpáticas, me receberam com um calor que contrastava com a tensão da estrada.

A praia de Guinjata se revelou como um verdadeiro refúgio. As águas cristalinas e a culinária rica me ajudaram a esquecer, por um momento, a viagem conturbada. Mas não era fácil deixar para trás as lembranças dos sustos na estrada.

Pensei nas famílias que dependem desse transporte para trabalhar ou visitar parentes. Pensei em quantas vidas poderiam ser salvas se houvesse mais responsabilidade ao dirigir.

Viajar para Inhambane é uma dádiva, mas chegar lá não deveria ser tão arriscado. A beleza do destino não justifica a imprudência no caminho. Os motoristas precisam entender que a pressa não ameaça só o tempo, mas também a vida.

Inhambane é encantadora e acolhedora, um verdadeiro paraíso. Mas a estrada até lá precisa ser mais segura, para que o destino não deixe de ser um sonho e vire saudade.

É preciso dizer, com toda a clareza: a vida é mais importante do que qualquer horário a cumprir. A obsessão por chegar rápido tem custado caro demais. Custado sangue, lágrimas, funerais prematuros. Os motoristas precisam, com urgência, resgatar o sentido de responsabilidade e humanidade ao assumir o volante. Respeitar os limites de velocidade não é apenas cumprir uma norma , é preservar a existência, é respeitar a fragilidade da vida, é honrar o direito de cada passageiro voltar para casa. A falta de observância dessas regras resulta em perdas irreparáveis: crianças que ficam sem pais, pais que enterram filhos, sonhos interrompidos por descaso. O volante não pode ser uma arma. Que a estrada seja caminho de esperança e não de tragédia.

 

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