segunda-feira, 4 de maio de 2020


PRAIA DA COSTA DO SOL
                
Como que por magia...

Texto: André Matola
Fotos: Carlos Uqueio

Num abrir e fechar de olhos desapareceram os quiosques que se estendiam ao longo da Praia da Costa do Sol, que eram uma espécie de íman para poucos banhistas e muitos bons vivans. Quem por ali passar hoje vai ficar de queixo caído e indagar-se-á como foi possível aquilo.
O certo é que agora do meio da estrada é possível espreitar as águas do mar, ver as ondas esbaterem-se na areia da praia, barcos a vela ao longe, petroleiros correndo no alto-mar, sem que para tal se tenha de alongar o pescoço.
As vendedeiras de frango, peixe, sobretudo magumba grelhada e temperada com molho de limão e piripíri podem estar a sentir um nó na garganta. Mas o horizonte é risonho. Vozes há, e não são poucas, que advogam a existência de uma feira dominical de frango e magumba, até porque seria sui generis na região.
Certo, certo é que as coisas não podiam continuar como estavam. Anarquia de bradar os céus misturada com maus costumes como cacos de garrafas de vários tipos de bebidas alcoólicas, despudor, bebedeira até o sol raiar, sobretudo aos fins-de-semana.
Agora há uma nova vida. Costa do Sol tem sol, mais sorrisos, mais higiene. Em suma, está mais saudável. A cidade  recupera, paulatinamente, um antigo slogan. Maputo cidade linda e organizada.
O céu é o limite. As imagens são do nosso colega Carlos Uqueio. Indubitavelmente, ele tem olho e... click.











quarta-feira, 22 de abril de 2020


                        Praia fantasma
               



Texto: Belmiro Adamugy
Fotos: Carlos Uqueio

De repente o silêncio tomou conta de tudo. Nem o marulhar faz mais sentido. O instinto de sobrevivência está no pico. Adrenalina pura. Fugir ou lutar? No caso, a resposta é mesmo esta: fugir, ficar em quarentena e olhar para o horizonte com fé. A COVID -19 conseguiu “limpar” a Praia da Costa do Sol. A “Pedra” não é a mesma. Os habituais convivas e a dezena de mamanas que ali fervilhavam - fizesse sol ou chuva miuda - sumiram. Volatilizaram-se. As barracas ficaram apenas para testemunharem essa estória recente. O que há de bonito nestas imagens captadas pelo foto-jornalista Carlos Uqueio, contrasta com o credo na boca com que vivem, por estes dias, aqueles que dependiam única e exclusivamente do negócio do frango assado, magumba com xima e umas cervejolas. A crise instalou-se tal como o coronavírus nas nossas vida. O medo, criou em plena praia uma pequena cidade fantasma… 














quarta-feira, 1 de abril de 2020

Quando o sol raia em Adis Abeba(Etiopia)
                                
                                                          
                                                        Texto: Carol Banze
                                                         Fotos: Carlos Uqueio

                                       
Nem sempre o raiar do sol liberta o homem do azedume da vida. Mas também, como diz o outro, nunca houve uma noite ou um problema que pudesse derrotar o nascer do sol ou a esperança. Assim, a cada raiar, brota a força interior libertada de almas imbuídas de prazer, prazer de colher, de viver.
Em Adis Abeba, uma cidade africana fundada em 1886, marcadamente comercial e cultural, o sol promove o calor humano e empurra-o apressadamente em direcção à rosa-dos-ventos, indicando, desse modo, o rumo aos indivíduos que a habitam. Ali, homens e mulheres cruzam-se entre o tracejado típico da modernidade, reflectido no tamanho dos arranha-céus possantes e exuberantes. Estas criações arquitectónicas, que se distribuem pelas inúmeras artérias da cidade, “contemplam” a azáfama humana exibindo perfis refinados que se distinguem dos outros povos pelo tracejado sem igual. Algumas destas molduras em forma de carne desfilam as vestimentas que traduzem as suas convicções e opções.
No largo das avenidas há espaço para tudo e todos; para o velho e para o novo. Veículos motorizados e não só transportam sonhos despertados dos homens que acordam para a vida.
E o que dizer de quem se prostra jogado num recanto da cidade? Pois, é deste modo que se configura a antítese típica das grandes cidades, onde se encontram ricos e pobres; o feliz e o infeliz.
Seja como for, o colorido desses lugares e das respectivas gentes acendem a todo instante a luz da esperança por dias melhores, afinal a vida é feita para ser vivida bem ou mal; empoleirado em amontoados de madeira; agarrado a uma fresta de vidro ou circulando centímetro a centímetro confiante no lucro que chega centavo a centavo, debaixo do sol. Em Adis Abeba, a vida corre como se conduz. À velocidade imposta pelas suas gentes. E o olhar de lince de Carlos Uqueio viu, gostou e registou.











sábado, 2 de novembro de 2019







Poema: Carlos Pronzato
Fotos: Carlos Uqueio
Quem te dará
A terra
Se não forem
Tuas mãos?
Quem te dará
A terra
Se não forem
Teus braços?
Quem te dará
A terra
Se não fores tu
Trabalhador do campo
Que semeias
Com suor
E sangue
O silêncio
Que geme na terra
O teu canto?
Quem?
Esse pedaço
De pedra
De terra
Em breve
Será pão
Será sustento
Escultura
Da terra lapidada
A partir de uma semente.
O camponês
Como o pescador
Lança sua mão
Armada
De enxada
E chão
Recolhe
Seu sustento
Até onde o latifúndio
Impõe
Seu horizonte
De desolação
E fome

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

XENOFOBIA
Ingratidão não mata a esperança

TEXTO: BENTO VENÂNCIO
FOTOS: CARLOS UQUEIO

A xenofobia na África do Sul está a revelar cidadãos ingratos, aqueles que mordem a mão que um dia foi estendida para ajudá-los e levantá-los. Este é o sentimento que domingo encontrou no Centro de Acolhimento de Maguaza, algures em Moamba, lugar de trânsito de cidadãos moçambicanos que sentiram na pele as mazelas da onda de xenofobia que atingiu recentemente este país vizinho.
Eram cerca das vinte e duas horas quando cento e trinta e oito cidadãos, entre os quais 16 crianças, atravessaram a fronteira de Ressano Garcia e repisaram o solo pátrio.
Eles faziam-se transportar em três autocarros. Um camião trazia o pouco que escapou dos saques.
Os meios de transporte foram agenciados no quadro de um trabalho combinado do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC), do Instituto Nacional para as Comunidades Moçambicanas no Exterior (INACE) e da Organização Internacional da Migração, que facilitou a evacuação daqueles que voluntariamente regressaram à origem.
Uma hora depois, cerca das vinte e três horas, davam entrada no Centro de Acolhimento de Maguaza, arredores da vila-sede do distrito da Moamba, província de Maputo, onde a noite fria ombreava com o cinzentismo de um momento de triste memória. Crianças e adultos choramingavam. Para trás chutavam a humilhação em terra alheia, onde perderam tudo, menos a esperança.
Repisavam o solo pátrio com a firmeza de quem tem a certeza de que “em nossa casa ninguém mais nos humilhará”, contudo, traziam no rosto um sorriso curto, agridoce, de quem desperta de enorme pesadelo.
Fomos batidos, humilhados, enfim, tratados como lixo, declararam algumas vítimas da xenofobia repatriadas da África do Sul, pouco depois da chegada ao centro de acolhimento.
E foram mais longe: parece que alguns cidadãos sul-africanos têm pavio curtíssimo e facilmente se esqueceram que Moçambique e outros países da região os acolheu nos tempos difíceis da segregação racial na África do Sul. Viviam, num passado recente, agrilhoados como escravos.
E sublinharam ainda: O “apartheid” definia-os como seres inferiores e catalogava-os como seres sub-humanos. Seus líderes viveram refugiados nas nossas terras, onde eram tratados de forma digna. Fizemos da luta deles uma luta também nossa. Perdemos muita coisa e até um Presidente para que eles ficassem livres. Já se esqueceram.
Descreveram a xenofobia como acto bárbaro praticado, tristemente, de irmão para irmão e levado ao extremo de matar mulheres, homens e crianças, apenas porque buscavam sustento numa terra que não é a deles.

Afiançaram que o número real de mortes está por revelar e o que está a acontecer no território sul-africano é uma verdadeira chacina aos estrangeiros, facto que deve ser levado muito a sério pelos restantes Estados africanos.

domingo apurou que parte dos repatriados regressou à terra que os viu nascer apenas com a roupa do corpo. Suas residências foram saqueadas e queimadas, sobretudo na região de Mandela, arredores de Joanesburgo.
Numa terra onde a palavra de ordem parece ser matar o estrangeiro, visto como o tal que “rouba” oportunidades de emprego, cidadãos repatriados guardam recordações amargas. As crianças ainda se agarram às mães com firmeza. Vivem com medo.

Vimos mães com duas, três crianças sob sua protecção, sem nada para oferecer, porque tudo foi roubado. Vimos pais cabisbaixos, sem chão para enterrar mágoas vividas na terra do “rand”, mágoas que marcam um presente que estremece e que condiciona o futuro dos seus.
Começaram a abandonar o Centro de Trânsito na sexta-feira, rumando às zonas de origem, designadamente Maputo, Gaza, Inhambane e Zambézia, segundo apontou Augusta Maíta, directora-geral do INGC.
Estamos satisfeitos com as condições no Centro de Trânsito. São as melhores possíveis, declarou, esclarecendo que os repatriados permaneceriam pouco tempo possível antes de rumarem para destino final, designadamente as províncias de Maputo, Gaza, Inhambane e Zambézia.
Logo após a chegada, alguns repatriados tiveram cuidados de saúde, pois, segundo Maíta, estava posicionada uma equipa médica em prontidão.
Continua...
Publicado in ''Jornal Domingo''

terça-feira, 17 de setembro de 2019

A cidade que nunca dorme…mesmo de dia!



Texto: Belmiro Adamugy
Fotos: Carlos Uqueio
                                       
Também chamada “Grande Maçã”, Nova Iorque é como uma mão de pedras rolando ladeira abaixo. Fervilha 24 horas por dia. Nunca dorme. É um enorme corpo em cujas artérias circulam diariamente milhares de pessoas - entre turistas e residentes - sem nunca perder a pose.
                                          
Vale lembrar que o Empire Building State, um dos mais antigos aranha-céus do mundo, está em Nova Iorque testemunhando as metamorfose que aquela urbe vai sofrendo. As torres gemeas, derrubadas há precisamente 18 anos, são ainda uma memória bastante presente nos nova-iorquinos… até nisso, a cidade consegue ser única.
Como qualquer cidade, Nova Iorque tem as suas peculiaridades. O olho clínico de Carlos Uqueio buscou, para além do cimento, vidro e ferro singularidades essencialmente humanas que nos fazem perceber que lá, como aqui, as pessoas são tão pessoas como os outros de outras paragens.   
                                           
Quem diz que não quer ir a Nova Iorque não imagina o potencial daquele lugar. A sua energia é contagiante, apesar de funcionar de forma “desorganizada” consegue sempre ser efeiciente e prestativa. Em Nova Iorque - parece que não - mas tudo funciona!