sábado, 20 de setembro de 2025

                     Elvira Viegas encanta no Centro Cultural Moçambique-China

Na noite de 29 de agosto, o Centro Cultural Moçambique-China foi palco de um espetáculo memorável protagonizado pela cantora Elvira Viegas. Com uma presença cativante e uma voz que atravessa fronteiras, a artista brindou o público com um concerto intimista, mas ao mesmo tempo carregado de energia e emoção.

A sala encheu-se de admiradores que acompanharam, entre aplausos e coros, os temas que marcaram diferentes fases da carreira de Viegas. O repertório transitou entre sonoridades tradicionais moçambicanas e influências contemporâneas, reafirmando a versatilidade e a autenticidade da cantora.

Mais do que um simples concerto, o evento transformou-se numa celebração da música nacional, num espaço de diálogo cultural que aproximou gerações e estilos. Elvira Viegas mostrou, uma vez mais, porque é considerada uma das vozes de referência da música moçambicana.





















sábado, 6 de setembro de 2025

                                                      PAINDANE

Lugar onde o mar acalma a alma


Por: Carlos Uqueio, publicado no jornal noticias, 6/09/2025


PRAIA de Paindane, na província de Inhambane, é um daqueles lugares que encantam logo no primeiro olhar. Os barcos pousados sobre a areia branca e o som das ondas criam um ambiente tranquilo, quase mágico.

É como se o tempo andasse mais devagar, permitindo que a gente aprecie cada detalhe com calma. Mas, por detrás de tanta beleza, existem histórias que merecem ser conhecidas, histórias de luta e respeito pelo mar. O que mais chama atenção na visita a este local não é apenas a paisagem linda, mas também a presença constante de pescadores.

Homens simples, com o rosto queimado pelo sol, saem todos os dias para o mar em pequenos barcos artesanais, muitas vezes com materiais reaproveitados. Esses barcos, mesmo sendo frágeis, enfrentam o mar em busca de peixe, o principal sustento das suas famílias. Cada ida ao mar é um acto de coragem, paciência e conhecimento passado de geração em geração. É uma rotina de esforço, fé e esperança.

Paindane continua a ser um lugar de sonho, um espaço onde a natureza, cultura e o trabalho convivem em harmonia. Mas é também um lembrete de que cuidar do meio ambiente precisa de ser prioridade, para que essa beleza dure por muito tempo.

Visitar Paindane é mais do que fazer uma viagem. É uma oportunidade de conhecer de perto a riqueza natural e humana de Moçambique e de pensar no que estamos a fazer para cuidar bem da nossa terra, porque a beleza verdadeira só continua a existir quando é protegida.













sábado, 16 de agosto de 2025

 

O fotógrafo oficial e o protocolo

Na vida pública, nada é por acaso. Uma cadeira deslocada, um gesto fora de hora ou uma fotografia mal enquadrada podem pôr em causa a imagem de uma instituição. É por isso que o fotógrafo oficial não pode limitar-se a dominar a técnica: tem a obrigação de conhecer as normas de protocolo.

O protocolo, lembra António de Araújo, é o conjunto de regras que asseguram ordem e respeito nas cerimónias. Quando o fotógrafo ignora esse código, corre o risco de se tornar protagonista indesejado: invade espaços restritos, interrompe discursos com cliques ou regista imagens que desrespeitam a hierarquia. O erro não é apenas fotográfico, é institucional.

Respeitar a ordem e a precedência é fundamental. Um chefe de Estado não pode aparecer deslocado numa foto de grupo. A discrição também conta: não há espaço para correrias atrás de ângulos ou para o barulho da câmara durante um hino nacional. O respeito ao espaço cerimonial é outra regra de ouro: atravessar zonas reservadas é mais do que falta de educação, é quebra de protocolo. Até a indumentária do fotógrafo comunica: o profissional também é parte da cena e deve estar à altura dela.

Juan Carlos Gafo insiste que “o protocolo não é rigidez, é harmonia”. E essa harmonia depende de cada detalhe. Uma fotografia pode valorizar um acto diplomático ou, pelo contrário, transformá-lo numa confusão de imagens mal posicionadas. Como bem lembra Sílvia Helena Zanirato, a comunicação institucional também se faz através das imagens. Muitas vezes, é a fotografia e não o discurso que fica para a história.

Em Moçambique, onde as instituições ainda consolidam a sua imagem perante os cidadãos e o mundo, o papel do fotógrafo oficial ganha peso extra. Ele não apenas regista: legitima. A sua lente testemunha momentos de Estado que se tornam memória colectiva.

Ser fotógrafo oficial, portanto, não é apenas carregar uma câmara. É carregar uma responsabilidade histórica. Conhecer o protocolo não é um detalhe: é parte essencial do ofício. A fotografia pode imortalizar a ordem e a dignidade de uma cerimónia. Ou pode eternizar o descuido. A escolha está, quase sempre, no olhar de quem está atrás da lente.

 Umbeluzi: Quando o sustento vira armadilha!

Texto e fotos de Carlos Uqueio, publicado no dia 16/08/2025-Jornal Noticias

Nas margens do rio Umbeluzi, em Boane, um retrato discreto e duro revela-se todos os dias. Ali, jovens e adultos mergulham tanto de dia assim como de noite, no leito do rio para extrair areia, que depois segue para obras e construções. O que para muitos é apenas matéria-prima, para eles é a única forma de garantir o sustento da casa.

Mas o preço é alto. O Umbeluzi é um rio que carrega crocodilos nas suas águas silenciosas, esperando por quem se distrai ou não tem escolha. Sem equipamentos de proteção, sem licença ou acompanhamento técnico, esses exploradores avançam com baldes e sacos, confiando apenas na própria força e na esperança de sair dali vivos.

A prática, além de ilegal, corrói o meio ambiente. As margens cedem, o leito do rio vai ficando mais fundo e o seu equilíbrio natural se perde. A extração descontrolada favorece inundações e destrói habitats, deixando o futuro do ecossistema tão vulnerável quanto quem arrisca o corpo dentro d’água.

Enquanto alguns se dedicam a explorar inertes, há mulheres que lavam roupa e carregam-na para o consumo, como ilustram as imagens. Não é só nas margens do rio que essa exploração acontece. Nas proximidades, formam-se pequenos grupos que também praticam essa actividade, evidenciando como a dependência da areia vai para além do leito do Umbeluzi e infiltra-se no quotidiano de quem vive ali.

“É daqui que tiramos o pão. Sabemos do perigo, mas não temos outro caminho”, confessa um jovem, sem largar o balde. O olhar dele, captado pelas lentes desta reportagem, diz o que as palavras não alcançam: a necessidade empurra para o risco, mesmo que seja contra a natureza  e contra a própria vida.

Esta reportagem fotográfica de Carlos Uqueio mostra  mais do que homens no trabalho. Ela expõe o contraste doloroso entre a luta pela sobrevivência e a destruição silenciosa do ambiente. Um ciclo que ameaça o rio, as suas margens e todos os que dependem dele.

No fim, fica a pergunta estampada nas imagens: até onde vale a pena cavar o presente, se isso significa afundar o futuro?










terça-feira, 5 de agosto de 2025

 

                               São Tomé e Príncipe:

              Um país pequeno, mas com histórias imensas

Localizado no Golfo da Guiné, a cerca de 300 quilómetros da costa de África Central, São Tomé e Príncipe é o segundo menor país do continente. Com pouco mais de 230 mil habitantes, o arquipélago é formado por duas ilhas principais e várias ilhotas, onde a natureza exuberante e o ritmo tranquilo do dia a dia se encontram. A língua oficial é o português, mas também se ouvem crioulos locais, reflexo da diversidade cultural do país.

As praias de São Tomé e Príncipe são parte essencial da vida dos seus habitantes. Em quase todas elas, é comum ver barcos de pesca alinhados na beira-mar. Essas embarcações, muitas vezes construídas de forma artesanal, são o sustento de centenas de famílias. Ao amanhecer, pescadores partem para o mar e regressam algumas horas depois com peixes frescos, que são vendidos directamente nos mercados ou nas próprias praias, onde o comércio informal dá vida ao cenário.

O comércio informal é, aliás, uma das marcas do arquipélago. Ruas e praças ganham cor com barracas de frutas tropicais, legumes, peixe seco, roupas e pequenos utensílios. Cada banca é uma história: mulheres que sustentam famílias, jovens empreendedores e idosos que mantêm vivas tradições antigas de troca e venda directa.

Para circular entre bairros, vilas e mercados, os mototáxis chamados localmente de “ya motó” , são indispensáveis. Rápidos e acessíveis, eles funcionam como o principal meio de transporte para quem vive ou visita o país. Não é raro ver passageiros equilibrando sacolas de compras ou mesmo produtos para revenda nas feiras locais, numa prova de como a economia formal e informal se entrelaçam no dia a dia.

Mais do que paisagens deslumbrantes, São Tomé e Príncipe é um mosaico de trabalho, tradição e proximidade entre as pessoas. Entre barcos à beira-mar, mercados improvisados e a agilidade dos mototáxis, cada detalhe revela a essência de um arquipélago que, apesar de pequeno, tem uma identidade rica e profundamente ligada ao seu povo.

 














sábado, 26 de julho de 2025

 Deuses do Lucro

 

Por: Carlos Uqueio

 

O Mercado Grossista do Zimpeto é muito mais do que um lugar onde se vai comprar cebola, batata ou tomate. É um mundo dentro de outro mundo. Um corpo vivo que respira ao som dos passos apressados, dos gritos dos vendedores e do cheiro da fruta madura. Mas, nesse ambiente intenso e cheio de vida, há também deuses invisíveis. Não são de madeira nem de pedra. São pequenos, silenciosos, mas poderosos: os deuses do lucro.

 

Fui vítima de um deles numa manhã aparentemente comum. Andava entre as bancas à procura da batata, tentando fugir da multidão que se apertava entre sacos e carrinhos de mão. Finalmente escolhi uma banca. O vendedor, com aquele sorriso maroto e voz experiente, disse: “Dê-me 40, 30, 20 meticais para facilitar o troco”. Soou prático. Entreguei o valor exacto. Confiei na pressa. Caminhei mais alguns metros e fui verificar. O troco estava incompleto. Fui enganado. Perdi. E fiquei com aquela sensação amarga de ter alimentado, mais uma vez, os tais deuses que só sabem tirar e nunca dar.

 

A prática é comum. Tornou-se quase rotina. Quem circula por ali frequentemente já aprendeu a desconfiar, a contar o troco na hora, a fazer cálculos duas ou três vezes.

 

Durante uma das limpezas organizadas pelo Conselho Municipal de Maputo, o que veio à tona não foram apenas os restos dos produtos apodrecidos ou os sacos plásticos espalhados no chão. Apareceram também objectos de rituais, garrafas enterradas, “swifungos” esquecidos, materiais místicos usados, dizem alguns que são usados para atrair clientes, garantir vendas e proteger o negócio.

 

Essa mistura mostra que muitos comerciantes já não confiam apenas na qualidade dos seus produtos ou no seu esforço diário. Passaram a depender da força invisível de amuletos e promessas espirituais. Mas há uma linha muito fina entre a fé e o engano. Quando a fé é usada como escudo para justificar atitudes desonestas, ela perde seu brilho. A espiritualidade, que deveria iluminar, começa a obscurecer.

 

E o problema não está só nos objectos enterrados ou nas moedas escondidas. Está no pequeno gesto de negar o troco certo, de inventar que “não tenho moedas” quando, na verdade, o objectivo é ficar com a diferença. É no abuso do costume de arredondar os preços sempre a favor do vendedor. E essa prática, repetida todos os dias, por centenas de comerciantes, corrói a confiança entre quem compra e quem vende. Cria um fosso invisível, mas profundo.

 

Zimpeto não é apenas um mercado. É um termómetro da nossa sociedade. Ali se reflectem as virtudes e os vícios da nossa convivência urbana. Muitos ali trabalham honestamente, lutam de sol a sol, acordam de madrugada, enfrentam poeira e chuva para garantir o pão dos filhos. Mas esses são ofuscados pelos que se tornaram servos dos tais deuses do lucro,  aqueles que fazem da esperteza um estilo de vida, que medem sucesso pela quantidade de trocos que ficaram por devolver.

 

A limpeza do espaço físico foi um bom começo. Mas ainda falta limpar o espaço moral. É preciso varrer a ganância disfarçada de astúcia, expulsar os truques que se tornaram norma, e abrir espaço para uma nova ética comercial, onde vender bem também signifique respeitar o outro.

 

O lucro verdadeiro, esse que vale e permanece, não é aquele que se faz enganando, mas sim o que se constrói com integridade. Porque um cliente que confia volta. E volta com mais alguém. Um cliente que se sente enganado, nunca mais regressa  e leva consigo a má fama.

 

Talvez seja hora de enterrarmos, de vez, esses deuses do lucro. Não com rituais ou campanhas simbólicas, mas com acções concretas: formação em ética comercial, fiscalização justa e contínua, campanhas de sensibilização nos mercados, e acima de tudo, um compromisso pessoal com a honestidade.

 

 Osaka Fala, Moçambique Ouve!

 

Por: Carlos Uqueio

 

Estive recentemente na cidade de Osaka, no Japão, e vivi uma experiência que me ensinou bastante. Não foi só uma viagem a um país diferente, foi uma verdadeira lição sobre como a sociedade pode funcionar melhor quando as pessoas vivem com honestidade, respeito e cuidado pelos outros.

 

Numa das noites da minha estadia, fui jantar num restaurante local onde fui muito bem atendido e saí. Só mais tarde percebi que tinha esquecido o  meu telemóvel em cima da mesa. Fiquei muito preocupado. Voltei rapidamente ao restaurante, achando que já tinha perdido o aparelho. Mas, para minha surpresa, um funcionário do restaurante já vinha ao meu encontro com o telemóvel na mão. Entregou-me com um sorriso calmo, fez uma pequena vénia e voltou ao seu trabalho. Não pediu dinheiro, não reclamou de nada. Apenas fez o que achava certo.

 

Esse gesto simples mostrou-me uma grande verdade: No Japão, as pessoas são ensinadas desde cedo a respeitar aquilo que é dos outros. Não pegam no que não é delas, mesmo que ninguém esteja a ver. Lá, a honestidade faz parte da vida. E isso tocou-me profundamente.

 

Outra coisa que me chamou atenção foi o funcionamento dos restaurantes. Lá, não existe a prática da “nyonga”, que entre nós é a gorjeta. Você paga só o que consumiu. Nada mais. E mesmo sem receber ‘’nyonga, o atendimento é excelente. As pessoas servem com respeito, com paciência, com profissionalismo. Não esperam “algo a mais” para te tratarem bem. Fazem bem feito porque têm consciência e educação.

 

Isso fez-me pensar muito sobre o nosso país. Em Moçambique, infelizmente, estamos habituados a dar gorjeta para receber um bom serviço. Muitas vezes, só somos bem atendidos se deixarmos um “refresco”. E quando alguém perde um objecto de valor, é raro encontrar quem o devolva. Tudo isso precisa mudar.

 

Outro exemplo: certa vez, em Osaka, perguntei a um senhor o caminho para uma loja. Ele não falava inglês, mas mesmo assim caminhou comigo até ao local, para ter certeza de que eu chegaria bem. Foi um gesto simples, mas cheio de significado. Hospitalidade não é só dizer "bem-vindo", é se preocupar com o outro.

 

O Japão não é perfeito, mas tem muitas coisas boas que nós podemos aprender e copiar. Lá, as pessoas vivem com ordem, respeito e responsabilidade. Não precisam de polícia em cada esquina para fazer o que é certo. Elas fazem porque aprenderam isso desde crianças.

 

E eu pergunto: por que nós, moçambicanos, também não podemos ser assim? Temos um povo bom, trabalhador, acolhedor. Mas precisamos mudar alguns hábitos. Precisamos ensinar as crianças que pegar no que não é seu está errado. Precisamos aprender a atender bem sem esperar sempre algo em troca. Precisamos respeitar mais uns aos outros, seja no trânsito, nos serviços, nos espaços públicos ou na convivência diária.

 

A mudança começa por dentro de cada pessoa. Se cada um fizer a sua parte, o país todo melhora. Não é preciso ter muito dinheiro para viver com honestidade. Basta querer fazer o certo.

 

De Osaka, trouxe muitas imagens e boas lembranças. Mas, acima de tudo, trouxe no coração a esperança de que Moçambique também pode ser um lugar onde a honestidade e o respeito sejam vividos todos os dias. Não por medo ou por obrigação, mas porque é assim que se constrói uma sociedade justa.